domingo, 30 de agosto de 2009

SENTENÇA - Prescrição Taxas Condominiais

APELAÇÃO CÍVEL Nº 2003011093084-9

Apelante - Gloven Múcio Pereira
Apelado - Condomínio Rural Mansões Belvedere Green
Relatora - Desa. Sandra De Santis
Sexta Turma Cível

EMENTA

CIVIL – AÇÃO DE COBRANÇA – DESPESAS CONDOMINIAIS – PRESCRIÇÃO – CONTAGEM – NOVO CÓDIGO CIVIL. 1. A partir da vigência do Novo Código Civil, o prazo prescricional das ações em que não tiver transcorrido metade do tempo previsto no Código de 1916 fluirá inteiramente nos termos da nova legislação. 2. Prevalece o entendimento de que o art. 206, §5º, inciso I, do Novo Código Civil não é aplicável às quotas condominiais por ser a convenção de condomínio tão-somente um documento que regula a cobrança das prestações devidas pelos condôminos, e não instrumento de fonte da obrigação. Aplica-se o disposto no art. 205 da mesma lei. 3. A contagem do novo prazo prescricional deve ser iniciada a partir da entrada em vigor do atual Código Civil. 4. Apelação improvida.

ACÓRDÃO

Acordam os Senhores Desembargadores da Sexta Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, Sandra De Santis – Relatora, Antoninho Lopes e Jair Soares – Vogais, sob a Presidência da Senhora Desembargadora Sandra De Santis em conhecer e negar provimento ao recurso, unânime, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasília (DF), 30 de agosto de 2004.

RELATÓRIO

CONDOMÍNIO RURAL MANSÕES BELVEDERE GREEN ajuizou ação de cobrança, sob o rito sumário, em face de GLOVEN MÚCIO PEREIRA. Afirma ser credor da importância de R$ 6.251,88 (seis mil, duzentos e cinqüenta e um reais e oitenta e oito centavos), atualizada até o momento da propositura da ação, referente às cotas condominiais em atraso e/ou taxas extraordinárias relativa ao lote 18.
Realizada audiência de conciliação não foi obtido acordo.
O MM. Juiz julgou procedente o pedido e condenou o réu ao pagamento das taxas inicialmente cobradas, bem como das não pagas durante o trâmite da ação, acrescidas de multa de 20% (vinte por cento) nas parcelas vencidas antes da vigência do Novo Código Civil, e de 2% (dois por cento) a partir de janeiro de 2003, com acréscimo de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês e correção monetária a contar dos respectivos vencimentos. Condenou-o, ainda, ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o total do débito.
Inconformado, apela o réu. Sustenta a ocorrência da prescrição dos débitos condominiais do período de outubro de 1994 a julho de 1998. Assevera que, na hipótese, não seria aplicável o artigo 205, mas o 206, §5º, inciso I, ambos do Novo Código Civil. Afirma que a cobrança não se encontra amparada no Código Civil de 1916. Menciona que nunca recebeu cobrança ou comunicação da dívida. Alega que o autor não trouxe aos autos a planilha de débito.
Preparo regular à fl. 91.
Contra-razões às fls. 95/97.
É o relatório.

VOTOS

Desa. Sandra De Santis (Presidente e Relatora) - Recurso tempestivo, cabível e regularmente processado.
Trata-se de apelo contra sentença que condenou o réu ao pagamento de taxas condominiais em atraso. O apelante, em suma, invoca a ocorrência da prescrição, com base no artigo 206, §5º, inciso I, do Novo Código Civil, e sustenta a ausência de planilhas de débitos nos autos. Razão não lhe assiste, ainda que por fundamentos diversos daqueles expostos pela julgadora monocrática. É que o direito de ação do demandante não estava prescrito no momento do ajuizamento. Inicialmente, cumpre destacar a nítida diferença entre a imediatidade dos efeitos de uma lei com a sua retroatividade. A Lei 10.406/2002 teve aplicação a partir da data em que entrou em vigor, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada, não sendo afastada, portanto, a incidência sobre os facta pendentia, desde que observadas as diretrizes de direito intertemporal traçadas em seu Livro Complementar. Na hipótese, verifico que os débitos postulados referem-se ao período de outubro de 1994 a julho de 1998 e que a ação de cobrança foi proposta somente em 28 de outubro de 2003, quando já estava em vigor o Novo Código Civil.
Forçoso convir que a MM. Juíza se equivocou quanto à aplicação da norma ao caso concreto, pois dispõe o artigo 2.028, em relação ao prazo prescricional já em curso quando da vigência do novo Código Civil, in verbis:

Art. 2.028. Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.

Com efeito, a partir da vigência do Novo Código Civil, o prazo prescricional das ações em que não tiver transcorrido metade do tempo previsto no Código de 1916 fluirá inteiramente nos termos da nova legislação. Dessa forma, como esclarece Maria Helena Diniz, "...as normas sobre os prazos decadenciais e prescricionais do novo Código Civil, apesar de tê-los reduzido, não retroagirão, pois apenas alcançarão as situações jurídico-temporais em que tiver transcorrido menos da metade do tempo previsto no Código Civil de 1916 ou em que aqueles prazos se iniciarem após sua entrada em vigor". (Comentários ao Código Civil: parte especial: disposições finais e transitórias, 22º volume, Editora Saraiva, 2003, pág. 66) [grifos não constam no original].
A jurisprudência tem caminhado no sentido de que a contagem do novo prazo prescricional deve ser iniciada a partir da entrada em vigor do Novo Código Civil. Confira-se o recente aresto da Relatoria da Desª. Ana Maria Duarte Amarante Brito:

CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. REPARAÇÃO CIVIL. PRESCRIÇÃO. CÓDIGO CIVIL DE 2002. CONFLITO INTERTEMPORAL DE NORMAS. ART. 2.028, DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. Na hipótese de pretensão da reparação civil de ilícito ocorrido na vigência do Código Civil de 1916, o prazo prescricional será o da lei nova (Código Civil de 2002) se, ainda que reduzido, não houver transcorrido mais da metade do prazo estabelecido na lei revogada. Inteligência do art. 2.028, do atual Código Civil. O prazo prescricional estipulado no atual Código Civil, no entanto, deve ser contado a partir da vigência desta, sob pena de se imprimir uma retroatividade exagerada à lei nova, extirpando completamente a pretensão da vítima. Agravo não provido. (AGI 2004.00.2.001329-1, DJ de 06/05/2004) [grifos não constam no original.

Não obstante o equívoco da julgadora monocrática, razão não assiste ao apelante, pois deve ser aplicado o prazo prescricional de 10 anos, previsto no artigo 205, caput, do Novo Código Civil. A ação de cobrança de débitos condominiais em atraso é perfeitamente válida, eis que não decorreu o lapso prescricional. Labora em erro o apelante ao invocar a ocorrência da prescrição com arrimo no artigo 206, §5º, inciso I, do Novo Código Civil. Este dispositivo não é aplicável às quotas condominiais por ser a convenção de condomínio tão-somente um documento que regula a cobrança das prestações devidas pelos condôminos, e não instrumento de fonte da obrigação. Américo Isidoro Angélico, ao comentar o disposto no artigo 206, §5º, inciso I, esclarece que:

(...) tal regramento não se aplica às quotas condominiais, devendo prevalecer em relação a estas a prescrição geral de 10 anos, apontada no art. 205.
Isto porque o nascimento da relação obrigacional estudada não se dá com a convenção de condomínio, que apenas regulamenta tal obrigação, tendo tal instrumento para alguns caráter contratual e para outros verdadeiro caráter normativo, posto estarmos diante das denominadas obrigações propter rem, ou seja, obrigações que surgem devido a relação jurídica existente entre uma pessoa e um determinado bem, relação esta de propriedade, no caso das quotas condominiais. Assim, a convenção de condomínio instrumentaliza a obrigação de cooperar com as despesas de manutenção das partes comuns nos denominados condomínios edilícios, mas não é propriamente fonte de tal obrigação. Esta obrigação, ressaltando-se seu caráter propter rem nasce, origina-se, da relação de sujeito de um bem à uma pessoa que se configure como seu dominus, ou seja, a simples circunstância de alguém ser proprietário de um bem imóvel, no caso parte ideal de um condomínio vertical. Algumas circunstâncias fáticas podem corroborar com o raciocínio exposto:
Inicialmente cabe asseverar que o proprietário de uma unidade condominial, mesmo não sendo signatário da respectiva convenção de condomínio, por ter adquirido o imóvel posteriormente a sua elaboração ou mesmo por desinteresse em participar de sua formação, é igualmente obrigado a concorrer nas despesas condominiais, eis o caráter propter rem das obrigações, sua obrigação têm caráter legal (é uma decorrência do status de proprietário do bem), é uma obrigação cuja fonte é a lei, e não um ato voluntário negocial, constante em instrumento público ou particular.
Mesmo os denominados condomínios de fato, ou seja, aqueles em que não há regular convenção de condomínio, podem cobrar de seus condôminos as parcelas relativas às quotas condominiais, constituindo este fato mais um elemento orientador de nossa posição, demonstrando claramente que não é a convenção a fonte da obrigação, pois assim se considerando, nestes casos não haveria sequer obrigação, sendo inviável a cobrança das quotas inadimplidas. (Condomínio no Novo Código Civil, editora Juarez de Oliveira, 2ª ed. p. 78/79)

Por fim, não merece prosperar a assertiva de que o autor não trouxe aos autos a planilha de débito, pois, ao revés do afirmado, está acostada às fls. 65/67.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso. É o voto.
Des. Antoninho Lopes (Vogal ) - De acordo.
Des. Jair Soares (Vogal ) - De acordo.
DECISÃO
Conhecido. Negou-se provimento. Unânime.

Nenhum comentário:

Postar um comentário